quarta-feira, 2 de março de 2011

Internet e infidelidade

Texto sugerido e enviado pela Andressa Maltaca do INTERCEF -  Instituto de Terapia e Centro de Estudos da Família de Curitiba, a quem agradeço pela colaboração.



INTERNET E INFIDELIDADE

A Internet apresenta novas possibilidades de relacionamento. Ela permite o encontro e a descoberta no anonimato. Quando as pessoas estão anônimas, comportam-se em geral de forma mais livre e mais despojada de preconceitos e máscaras. Gostam de se expor deste modo. Podem fantasiar que são melhores do que são, e podem despir-se de inibições.
Encontrar pessoas pela Internet e relacionar-se "intimamente" com elas traz para dentro de casa uma possibilidade nunca antes vivida. Casais que vivem frustrações no casamento encontram facilmente a saída rápida e segura para expressar suas fantasias e desejos, protegidos pela distância e anonimato. A tela e o teclado tornam-se amigos concretos, o computador passa a ser o aliado. Substitui-se assim a ameaça do relacionamento real, e ele pode ser vivido sem riscos.
É o encontro pela Internet considerado infidelidade? Os adeptos dizem que não, pois se defendem com o fato de o relacionamento não envolver sexo real. Porém, se alguém é casado e investe energia, tempo, fantasia e romantismo em outra pessoa, está sendo fiel?
A fidelidade e a infidelidade dependem do conceito que o casal tem delas, e do pacto de confiança que estabelecem entre si. Para alguns casais, infidelidade não é encontrar-se com outra pessoa, e sim apaixonar-se por ela. Para outros casais, o pacto inclui que eles viverão um com o outro, e se tiverem problemas terão que enfrentá-los dentro do casamento. Vale a pena investigar o que cada um vai buscar no relacionamento virtual, e porque não encontra isto no mundo real, dentro de seu casamento.
O que as pessoas buscam nos encontros pela Internet?
Romance, namoro, aceitação, fantasia, ilusão, anonimato, ausência de censura, partilha de sentimentos...
A internet realiza alguns desejos incompatíveis com a vida cotidiana. Não há compromisso com a verdade. Ela dá vida aos desejos reprimidos. Cria um mundo  de facilidades.
A Internet mudou o flerte. O flerte era ponto de partida para a aproximação de um casal. Pela Internet é a palavra que se torna a arma mais poderosa no jogo da sedução. Há pessoas que dizem que o erotismo on line não traz novidade, que se trata de mais um estímulo, como as revistas pornográficas ou um vídeo erótico. Por mais que um internauta engate em conversas em tempo real, fisicamente ele tem de se satisfazer sozinho. A diferença é que do outro lado alguém interage com ele e alimenta suas fantasias, e é esta interatividade anônima e a imprevisibilidade "protegida" que dela decorre que tornam este contato tão excitante.
O romance virtual é uma imitação quase perfeita do romance da vida real. O amante virtual, como não tem rosto nem identidade, é virtualmente perfeito, pois depende da imaginação de cada um. Mas se o relacionamento pela internet traz menos riscos, a vida real é mais difícil de ser encarada. Quando surge o desinteresse pelo parceiro, na vida real, é difícil romper. Na internet, quando surge o desinteresse, é só deletar o parceiro!
O anonimato que se estabelece na Internet permite que as pessoas se soltem mais, especialmente as tímidas e inseguras. Elas podem criar uma imagem de si que é a ideal, aquela imagem que elas gostariam de ter. Elas podem escolher o que querem ser, e mostrar-se ao outro do modo melhor que escolheram para si. Assim, sentem-se artificialmente seguras, e podem anonimamente revelar-se nos seus desejos e fantasias, com mais coragem e desinibição. A Internet transformou-se no maior serviço de encontros de todos os tempos, segundo o psiquiatra Alvin Cooper.
Protegidas pelo monitor, muitas pessoas relatam falar a verdade sobre o que realmente importa, sobre seus gostos, sensibilidade, temores. Elas podem dar-se ao luxo inclusive de relatar coisas menores, que aos olhos do outro se tornam importantes.
A tela e o teclado transformam-se no corpo da outra pessoa. O amante do outro lado da tela tem uma identidade questionável, pois ele escolhe também uma imagem que quer mostrar à outra parte envolvida. Não se sabe de fato se ele é o que diz ser, nem quem ele diz ser. Será que ele existe ou é uma invenção? Ele é na verdade um amante desconhecido.
Quando a pessoa tecla, tem a sensação de poder partilhar seus sentimentos. Na vida real, quando ambos estão frente à frente, este contato íntimo muitas vezes não se dá, pois cada um pode estar sintonizado em coisas diferentes no momento, ou porque o casal não tem a intimidade necessária para poder se expor nem a afinidade para compreender os sentimentos do outro. A intimidade é uma condição difícil de estabelecer para alguns casais, e falar de si para o outro nem sempre é possível. Falar de si atrás da tela é mais protegido, e isto explica que muitas pessoas se sintam à vontade na Internet para contar coisas íntimas a desconhecidos.
No mundo concreto, as pessoas se aproximam inicialmente por atributos superificiais diversos, e depois se descobrem mais profundamente à medida que o relacionamento evolui. No mundo virtual, elas se sentem atraídas pelas qualidades que vêem no outro, e só depois terão a oportunidade de se descobrir fisicamente. A questão é se as qualidades são reais. Às vezes são, e há vários relatos de pessoas que se aproximaram de forma bem sucedida e que estabeleceram relacionamentos duradouros iniciados on-line. Há bem menos relatos, porém, de que relacionamentos fruto da infidelidade virtual tenham tido o mesmo caminho.
Uma das coisas que mais renovam a vida é o acaso. Na internet os encontros são casuais, começam sem que se possa planejar com quem ocorrerá o encontro. O acaso terá um papel fundamental, e isto é estimulante para todo mundo.
Definir que a Internet é prejudicial para os que buscam nela uma forma de relacionamento não abrange a motivação das pessoas que a usam. Há cientistas que afirmam que esta prática pode ser saudável.  Usuários pesados, que praticamente só têm este tipo de contato, por outro lado, são pessoas que temem lidar com o sentimento de rejeição ou temem trocar afeto, enfim, têm inseguranças que os impedem de enfrentar o mundo dos relacionamentos.
Qual é o papel do relacionamento virtual para um casal? O que o casal ou um cônjuge busca na Internet?
Sexo protegido, aventura, apimentar a vida sexual monótona, paixão, adrenalina, intimidade perdida, extravasar desejos reprimidos, refúgio? Seja o que for que o parceiro busca, ele está optando por buscar resolver fora do casamento algo que não está encontrando no casamento.
Isto justifica sua decisão?
Todo o relacionamento tem um decréscimo de paixão e intensidade com o passar do tempo, e estes sentimentos são substituídos por outros decorrentes da convivência.
Se não se encontra algo no casamento, há vários caminhos a tomar: abordar a questão com o cônjuge, buscar aconselhamento com profissional, conversar com outras pessoas conhecidas do casal, que podem ter vivido algo semelhante e trocar experiências, ler, obter informações. Enfim, recorrer a outro relacionamento como solução é uma decisão tomada por quem o faz; a pessoa tem que ter consciência de que a responsabilidade sobre esta decisão é sua, e das consequências que isto traz ao relacionamento.
Fantasias sempre fizeram parte das relações matrimoniais. Mais cedo ou mais tarde um ou ambos sente saudade de emoções que já não sente. A rotina abre as portas para o tédio. Fantasiar é uma compensação para isto. É natural e não causa divórcio. Teclar com um desconhecido não é o mesmo que fantasiar, pois existe interação com outra pessoa. Estabelece-se uma relação entre ambos. Existe do outro lado uma pessoa que sente, responde, que conta o que comeu no almoço, que malicia. Ela é um amante em potencial.
Quando um cônjuge não consegue conversar com o parceiro sobre assuntos que o tocam, mas consegue com outro fora do casamento, cuja companhia ele aprecia, e tem que guardar segredo sobre isto, se afasta cada vez mais do seu parceiro. Pois aquilo que conta ao outro, não conta ao cônjuge.
E o relacionamento de fora, que parecia proteger o casamento, contribui para aumentar a distância.
Os enamorados que contam a verdade um para o outro, buscam o prazer da intimidade. Quando se contam mentiras ou se omitem experiências de intimidade com outras pessoas, tenta-se evitar o castigo ou a dor. O resultado é que se perde a espontaneidade, e a pessoa tem que censurar-se cada vez mais sobre o que vai falar com o outro, para não se entregar. E tem que começar a mentir para esconder o segredo. E isto a afasta do cônjuge. Aquele que mente não pode falar do fundo do seu coração. Ele se separa então não só do parceiro, mas também de si mesmo.
Há relacionamentos que, ao contrário da falta de proximidade, são tão próximos, tão grudados, tão um para o outro, que falta ar na relação. Individualmente, cada um necessita espaço para ter sua vida independente, porém não pode falar com o cônjuge sobre esta necessidade, porque o outro pode pensar que ele está se afastando.
Ambos precisam de um pouco de privacidade, aquela que é saudável para cada um, mas não conseguem negociar esta privacidade. Temem que ao ter privacidade, o outro poderá ficar solto e trair. Pois é exatamente o que ocorre. Para ter a ilusão de privacidade, um dos parceiros começa a se corresponder com algum desconhecido, e sente assim que domina uma pequena parte de sua vida. É como se, ao ter um relacionamento secreto, a pessoa tivesse a liberdade que ela necessita. O casal fica grudado para não trair, e acaba traindo porque está excessivamente grudado. Está claro que o cônjuge não quer um relacionamento real, por isto busca a internet.
Se o casal vai ou não considerar como infidelidade o relacionamento virtual, como já foi dito, depende de sua concepção do que é infidelidade. Há casais que afirmam que entrar numa sala de bate-papo sem interesse de continuidade não é infidelidade, e sim somente curiosidade. Mas a partir do momento que se estabelece uma conversa privada, repetida, com encontros marcados para teclar, o relacionamento virtual já se configura como encontro, e isto é para eles infidelidade.
A infidelidade é a quebra de um pacto de confiança. O pacto será diferente de casal para casal, mas ele existe, embora nem sempre seja claro. O que é infidelidade também pode variar de pessoa para pessoa, e algumas consideram que só há infidelidade quando há envolvimento sexual.
Seja qual for a concepção que o casal tem sobre o que é ser infiel, a busca de aliados fora do relacionamento encobre os problemas do casal, e adia sua resolução. Alivia temporariamente a insatisfação, mas cria um afastamento maior. O medo da separação faz com que o casal afastado não olhe para si. Porém, em algum momento, um dos dois encontra o que quer e pode provocar o rompimento.
A infidelidade pode representar a busca do novo. Mas se o novo não puder ser criado e recriado dentro do casamento, o cônjuge estará se condenando a repetir a experiência da busca extraconjugal continuamente. Neste caso, seu casamento sofre uma perda de intimidade cada vez maior, e fica vulnerável.
Se para os cônjuges o relacionamento for algo a preservar, se for um tesouro, ainda que esquecido de seu brilho, a busca de aliados fora do casamento contribuirá para torná-lo mais opaco ainda. Mesmo que haja pessoas que encontrem temporariamente a emoção no relacionamento extraconjugal, e que inclusive afirmem que o relacionamento de fora traz melhoras ao relacionamento oficial, a porta que se abre oferece uma saída para ser usada sempre que o relacionamento não corresponder ao que desejam. Elas correm o risco de esquecer que é delas também que depende que as jóias do tesouro sejam redescobertas, polidas e valorizadas.
O que fazer quando o cônjuge trai on-line?
A situação é delicada, pois é como se a traição estivesse ocorrendo dentro de casa.
É preciso conversar, e examinar as razões pelas quais a pessoa resolveu buscar o relacionamento virtual. Talvez o casal tenha pela primeira vez, depois de muito tempo, a oportunidade de falar francamente sobre si e sobre o relacionamento. Por mais que doa, é uma forma de olhar corajosamente para o casamento. Uma crise como a que decorre da revelação da infidelidade, seja ela virtual ou real, apresenta a oportunidade de cada um ser honesto com o outro e consigo mesmo. E isto começa a recriar a intimidade, a aproximação.
Por outro lado, a quebra de confiança é difícil de superar. É intolerável pensar que o computador está ao alcance da mão do parceiro o tempo todo, e que ele sempre pode estabelecer contato com o amante virtual, a qualquer hora do dia e da noite.
O cônjuge infiel precisa examinar o que quer do casamento, e o que quer para si mesmo. Ele pode estar passando por uma crise pessoal de perda de autoestima, e ter encontrado no relacionamento virtual uma fonte extra de autoestima.
Ele terá que reconstruir a confiança que pôs a perder quando abriu a porta do casamento. Precisará pedir perdão genuinamente, e desenvolver atitudes confiáveis e transparentes, para que evite ser mal interpretado. Uma das maiores dificuldades quando se perde a confiança no casamento, é que aquele que desconfia não sabe o que fazer para voltar a confiar, e aquele que quer recuperar a confiança não sabe como convencer o outro que voltou a ser confiável.
O restabelecimento da confiança vem com o tempo e com atitudes transparentes, sérias e sólidas. Transparência significa abrir os e-mails para o cônjuge ler, eliminar os endereços escondidos, mas também e principalmente, significa reabrir-se para a intimidade no relacionamento.
O casal que necessita de individualidade precisa revisar como entende a individualidade e tem que criar espaços de privacidade que respeitem as necessidades de cada um.
O relacionamento pode crescer com a crise criada pela infidelidade virtual. Afinal, se a pessoa quisesse de fato trair, iria fazê-lo pelo computador?
"A maioria das pessoas se casa acreditando em um mito, de que o casamento é uma linda caixa cheia das coisas que elas esperaram a vida inteira: companheirismo, satisfação sexual, intimidade, amizade. A verdade é que o casamento, no começo, é uma caixa vazia. Você deve colocar algumas coisas dentro dela, antes que possa tirar. Não há amor no casamento, o amor está nas pessoas e as pessoas colocam o amor no casamento. Não há romance no casamento, as pessoas têm que colocá-lo no casamento. Um casal deve aprender a arte e formar o hábito de dar, amar e servir - manter a caixa cheia. Se você tirar mais do que puser, a caixa se esvaziará." (J. Allen Petersen).
CRP – 08/0501
Coordenação do Instituto de Terapia e Centro de Estudos da Família - INTERCEF


Um comentário:

  1. Dra. Rosana Ferrari,

    Sou seminarista cursando Teologia Pastoral e estou realizando a minha monografia relacionado a "ADULTÉRIO" e venho a entrar em contato com você, pois ao pesquisar na internet vi este seu trabalho.

    Estou a procura de informação de índices de homicídios cometidos por motivo de infidelidade sexual.

    Se puderes me ajudar, estarei aguardando o seu contato.

    Email: miguelangelo.atalaia.de.cristo@gmail.com

    MIGUEL ANGELO - ATALAIA DE CRISTO

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